quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA

RESENHA. BRITTO, L.P.L. O ensino da leitura e da escrita numa perspectiva transdisciplinar. IN: Práticas de letramento no ensino, leitura, escrita e discurso. (ORG) CORREA, A. Djane e SALEH, P.B. Oliveira de. Ed. UEPG. Paraná, 2007 p.53/77.

Edineia Azevedo[i]

Joelma Senna[ii]

Luiz Percival Leme Britto é doutor em linguística pelo Instituto de Linguagem da UNICAMP e atua no campo da educação e linguagem. Atualmente é professor da Universidade de Sorocaba no curso de Letras e no programa de pós-graduação em educação. Entre suas publicações estão os livros Contra o consenso, Cultura escrita e diversos artigos sobre ensino de língua, educação, formação universitária e cultura escrita, abordando o direito de ler como um fundamento de cidadania. Em seu artigo O ensino da leitura e da escrita numa perspectiva transdisciplinar, defende uma educação organizada em torno de eixos temáticos e vinculada aos interesses comunitários locais para o ensino de Língua Portuguesa. Para o autor, o debate atual em torno do que fazer na e da disciplina de Língua Portuguesa na educação regular vem se reproduzindo sem avanços significativos desde o surgimento da linguística como campo de pesquisa no Brasil em 1970.

A partir desse debate surgiram novas propostas para o ensino de língua, de redação e de literatura marcadas pelos pressupostos da linguística entre elas a proposta de partir do texto, consubstanciado em práticas de escrita e análise linguística. Todavia, a disciplina de Língua Portuguesa nessa perspectiva (apresentada pelo autor como impossível na lógica disciplinar) ficava sem conteúdo específico se considerar a forma de organização das práticas didáticas no espaço escolar, tendo prevalecido a perspectiva de que a função da educação linguística é o ensino de Língua Padrão.

Segundo Britto, o problema dos embates no ensino de Língua Portuguesa no Brasil se restringe a uma questão metodológica, uma nova forma de se organizar e ensinar os mesmos conteúdos disciplinares e os métodos utilizados mas, que não se tem clareza do que seria um novo conteúdo. Assim, ele atribui duas razões para tal contradição: a crise do modelo enciclopédico de educação escolar e a manutenção de uma produção centrada na disciplina, o que acaba gerando a indefinição do objeto de ensino e ainda, permitindo a reprodução de conteúdos e práticas tradicionalistas. Dentro desse contexto, Britto reconhece o paradoxo que caracteriza a crise escolar: se por um lado a escola é uma instituição necessária aos moldes de organização da sociedade contemporânea, por outro ela acaba agindo contra os modos de organização social e de produção, circulação do conhecimento, como também da integridade individual e coletiva dessa mesma sociedade. Para usar o termo do autor, ela é anacrônica.

O professor argumenta que o problema está na falta de uma alternativa de educação consolidada e que, qualquer novo modelo criado a partir do existente acaba reproduzindo as bases da educação tradicional escolar, com função apenas paliativa. Ele aponta a educação transdisciplinar como sendo a mais consistente na elaboração de um novo objeto de ensino, visto que essa orientação não limita-se ao conteúdo de uma disciplina apenas, mas se relaciona com diferentes saberes disciplinares, os quais perdem suas especificidades para a constituição de um novo campo do saber.

Percival destaca ainda a impossibilidade de neutralidade no discurso pedagógico e embasado nas ideias do educador Paulo Freire enfatiza a importância da não separação da educação e da política para o exercício crítico da capacidade de aprender e para o desenvolvimento da curiosidade epistemológica no processo de ensino. É na maior experiência que os educadores tem com os discursos formalizados pela cultura escrita que se sustenta a ação pedagógica. O educador e o educando embora diferentes, aprendem um com o outro, fazendo do conhecimento em equipe um processo responsável pela produção de sentido entre teoria e prática.

Considerando a análise anterior, o autor propõe alguns princípios diretivos do ensino da leitura e da escrita. Para ele, o principal aspecto a considerar é que o trabalho com a escrita e a leitura ocorra continuamente ao longo das atividades escolares. Sugere a organização da leitura e a preparação de intervenções do que e de como se pretende fazer produção de roteiros, síntese e resumo, dentre outras formas de técnicas utilizadas para melhorar a compreensão do que foi lido. Britto argumenta ainda que, para haver mudanças significativas nessa pesrpectiva, a escola precisa aceitar que a responsabilidade de ensino da leitura e da escrita seja de todos, visto que suas práticas fazem parte das atividades de todas as disciplinas, cabendo ao professor de língua portuguesa as questões especificamente de linguística e literatura.

O linguista defende a introdução de textos diversos no roteiro de leituras, não só o que seria de interesse dos alunos, mas todo tipo de textos, organizando, assim, um acervo com estes materiais de leitura. O mesmo que se pretende com a leitura deve-se por em prática com a escrita, pois o hábito de escrever deve ser diário e constante, e isto exige investimento por parte do educando. Com o processo pedagógico sugerido por Britto, acredita-se que a partir da organização de leitura o educando vai conhecendo as características dos gêneros textuais, suas finalidades e os meios de circulação.

Nas perspectivas apontadas acima, o autor apresenta alguns referenciais que podem orientar o trabalho com leitura e escrita. Assegura que ler não se resume a um processo de decodificação, supondo a participação em eventos de produção de sentido mediado pelo texto escrito e a compreensão do mesmo. E ainda, a importância de considerar atividades complementares como leitura autônoma e assistida.

Considerando os tipos de atividades e suas finalidades, o leitor tem que assumir uma postura própria de conduta com o texto. A ação educativa incorre na busca de estratégias para que o educando se torne capaz de, na leitura de diferentes gêneros, detectar o tema, associar o texto aos contextos possíveis, identificar a tese, dentre outras características existentes. Todo esse processo implica conhecer, entre outras coisas, a organização formal de um texto e as estratégias de argumentação.

As leituras de estudo e de trabalho são as que mais exigem organização e monitoração. O trabalho de leitura em função da tarefa e de seus interesses implica saber fazer marcação de textos, comentários de margem, recortes, seleção de fragmentos, esquemas, roteiros de leituras e resumos. Além dessas dicas de organização e esquematização de leitura, o artigo aponta estratégias de uso da escrita, que vai desde a identificação de palavras chaves até redação de frases síntese. Britto chama a atenção também para a diferenciação entre produção textual e redação e afirma que escrevemos menos do que lemos, e que essas escritas às vezes são pessoais, outras profissionais, havendo nesta uma maior preocupação com as convenções da escrita. Para a redação de textos variados, o linguista chama a atenção para algumas regras, considerando o gênero, o veículo, o meio de circulação e o interlocutor; dentre elas, planejar a ação, estabelecer objetivo, reunir e selecionar argumentos.

O autor também chama a atenção para a fala pública, o uso da escrita como suporte da oralidade e considera a capacidade de falar em público primordial em muitas atividades. Assim como alguns textos escritos, há textos falados que se submetem a certas convenções, ao fazer um pronunciamento em público a pessoa deve se apoiar em textos escritos. No texto oral, mais importante do que falar conforme a norma canônica é considerar a situação e o interlocutor. O orador deve ter dentre outras habilidades, o domínio do discurso, fazer planejamento da ação e usar recursos técnicos. Os recursos e as estratégias pedagógicas também são úteis no desenvolvimento do domínio da fala, análise de vídeo gravado, simulação de situação de público e atividade de descontração.

Em suma, para Britto, o domínio dos recursos da escrita se adquire no uso e na reflexão sobre o uso. Para isso, ensinar a ler e escrever não pode ser regido por regras e normas de bem falar, desrespeitando os conhecimentos prévios do educando. O objetivo principal deve ser a orientação para que o educando desenvolva o melhor possível a capacidade de ler e escrever bem. Esta educação deve ter uma proposta humanista, capaz de transformar, desatrelada das convenções. Afinal, estamos educando para desenvolver competências e habilidades que sejam úteis no futuro e o avanço da tecnologia criou novas habilidades e possibilidades de ensino/aprendizagem, o educador precisa estar atento ao fato de que o aluno chega à escola com conhecimentos linguísticos anteriores que devem ser respeitados.

As praticas pedagógicas atuais precisam atender a uma nova realidade, o aluno precisa estar habilitado para lidar com situações, complexas de leitura e escrita, e o professor, por sua vez, preparado para os novos desafios que o ensino de língua aponta. O mesmo deve levar o aluno a usar o que sabe para resolver questões reais. Concluímos, ratificando que o texto fomenta as discussões em torno do ensino de Língua Portuguesa na atualidade e que, de fato, é um achado para pesquisadores, estudantes e professores da área de ciências humanas e de ciências afins, preocupados em abordar a questão da leitura e da escrita na sala de aula numa perspectiva transdisciplinar.



[i] Graduanda em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB Campus de Jequié-BA. Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação á Docência - PIBID/UESB, Subprojeto de letras, campo de atuação colégio Estadual Luiz Viana Filho – CELVF Jequié – Bahia.

[ii] Graduanda em Letras pela Universidade Estadual do sudoeste da Bahia - UESB Campus de Jequié-BA. Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação á Docência - PIBID/UESB, Subprojeto de letras, campo de atuação Instituto de Educação Regis Pacheco – IERP Jequié – Bahia.