sexta-feira, 15 de junho de 2012


GRAMÁTICA VARIAÇÃO E NORMAS

Sidineia Moreira Santos

CALLOU, Dinah (2007). Gramática, variação e normas. In: SILVA & BRANDÃO. Ensino de gramática - descrição e uso. Rio de Janeiro: Contexto, 2007.

O texto de Dinah Callou “Gramática, variação e normas,” publicado no livro “Ensino de Gramática – descrição e uso,” pela editora Contexto no ano de 2007, faz uma abordagem crítica acerca de questões inquietantes e recorrentes envolvendo gramática, variações e normas.
A autora inicia seu texto elencando uma série de importantes questionamentos envolvendo gramática, variação e normas, argumentando com clareza que, não existem respostas definitivas acerca dos questionamentos levantados.
Em seguida, a autora passa a teorizar enfaticamente sobre a crise e o empobrecimento do ensino de língua e da aprendizagem de nossa língua, esclarecendo que isso não diz respeito apenas à língua portuguesa e não se restringe apenas ao Brasil.
Amparada no discurso de posse do gramático Celso Cunha á cadeira de Português do Colégio Pedro II em novembro de 1952, a autora afirma que, a preocupação com o ensino de língua vem de muito longe e que, embora tenha decorrido mais de cinquenta anos do referido discurso à situação ainda não se modificou. Sendo assim, a autora afirma acertadamente que a crise no ensino de língua materna no Brasil está relacionada a problemas de natureza socioeconômica, sociocultural e pedagógica.
Debruçando-se inicialmente sobre os problemas de natureza pedagógica, a autora questiona a formação docente nos cursos de letras afirmando que estes constituem-se apenas como uma tentativa de recuperação das deficiências do ensino fundamental e médio e sugere que seja feita mudanças na formação dos docentes, nos conteúdos e nos procedimentos de ensino de língua e, para isso, a autora delega a universidade a criação de meios que possibilitem aos futuros docentes a investigação da realidade linguística no Brasil.
Continuando seu texto, a autora utiliza como suporte argumentativo um artigo de João Ubaldo Ribeiro, publicado no jornal “o Globo” em 11/08/1985, intitulado “Questões gramaticais” e passa a analisar as ambiguidades existentes no texto acerca do termo Gramática, e afirma sabiamente que a gramática e a norma linguística podem ser vistas por vários ângulos e aponta acertadamente que as várias concepções de língua deram lugar a orientações e objetivos pedagógicos diferenciados, não estando o objeto de estudo claramente definido e não se pondo de acordo com linguistas no que se refere a modalidade de uso que deve ser ensinada.
Ainda falando sobre normas, a autora faz alguns questionamentos sobre que norma ensinar e, passa a tecer reflexões, alicerçada no conceito de norma existente no “Dicionário de linguística” (1978) de Matoso Câmara Junior, pontuando que ao trabalhar com a norma lidamos com preconceitos de ordem socioeconômica e sociocultural, enfatiza assim que há uma pluralidade de normas e ressalta claramente a necessidade de uma reavaliação do lugar da norma em nossa sociedade.
No parágrafo subsequente a autora afirma que a pluralidade de normas existentes em nosso país é fruto da dinâmica populacional e do contato com os diversos grupos étnicos em diferentes momentos históricos e, tendo em vista essa heterogeneidade linguística a autora contesta a ideia de se pensar língua em termos de certo X errado, melhor X pior, bonita X feia.
Citando os trabalhos de Rona (1965); Rosenblat (1967) e Gagné (1983), a autora exemplifica que os textos supracitados testemunham a respeito da questão da norma e do ensino em outras línguas. E, debruçando-se sobre o trabalho de Rona, Dinah afirma que a autora aponta que nos países hispano-americanos, o ensino de língua está baseado na linguagem literária extradiassistemática que, permite ao aluno possuir dois sistemas linguísticos: um de nível mais baixo e outro de nível acadêmico, mas ambos não corespondem ao uso culto local.
Diante do exposto acima, Dinah defende veementemente a ideia de se descrever as normas existentes em nosso país para que frente às possibilidades da língua o falante possa escolher aquela que for mais apropriada para se expressar em uma determinada situação comunicativa. E, ao ressaltar os interesses dos sociolinguistas em levar os resultados das suas pesquisar para a sala de aula, a autora critica a postura de alguns grupos sociais e o seu excesso de puritanismo em relação à língua e, em decorrência do caráter reacionário da nossa sociedade e da escola, a autora adverte que a inserção do resultado das pesquisas em sala de aula deve ser tratada com cautela, no entanto, a autora defende uma atuação mais agressiva e mais eficiente que garanta a eficácia no ensino de língua.
Prosseguindo o texto, Dinah destaca o trabalho de Rosemblat que atribui á noção de correção um caráter extralinguístico e defende que, o ensino da variedade culta deve prevalecer sobre as demais, uma vez que existe um ideal linguístico imposto por um consenso social. Portanto, para Rosemblat é imprescindível que a norma padrão seja ensinada aos alunos.
Em contrapartida a autora cita o trabalho de Gagné, que também faz parte dessa coletânea organizada por Bédard (1938). No trabalho de Gagné a autora debruça-se sobre dois pontos abordados pelo autor que afirma que um dos objetivos do ensino de língua se situa nas atitudes referentes à variação linguística e que o ensino pautado numa orientação menos prescritiva não consegue evitar os improvisos.
Ao fim da análise feita pela autora acerca dos estudos de Rona, Rosemblat e Gagné e, respeitadas as especificidades de cada trabalho, a autora salienta coerentemente que no ensino de língua o que deve prevalecer é o bom senso, uma vez que a língua passa por mudanças e que, a defesa de um purismo linguístico nada mais é que um conhecimento deficiente da própria língua.
Assim, resaltado e respeitado a existência de uma multiplicidade de normas existentes, a autora defende a ideia de que é impossível manter uma norma purista no mundo atual e, demonstra que lidar com língua é lidar com a variação e essa variação existe até mesmo nos falares ditos cultos e adverte ainda que, a homogeneização, por meio da escrita, busca neutralizar as marcas identificadoras de cada grupo social para atingir um padrão único, abstrato e idealizado.
Após essa breve discussão, Dinah passa a fazer uma reflexão sucinta acerca do ensino e da constituição de normas no Brasil, criticando que antes de 1981 ensinar significava aceitar o código e transmiti-lo, no entanto, o código tornou-se algo tão diverso e complexo que já não pode mais ser definido apenas pela legislação mais antes pesquisado, avaliado e estudado.
No que tange as pesquisas acerca da heterogeneidade linguística no Brasil, a autora aponta projetos e trabalhos conclusos e em andamento, que analisam corpora diferenciados e cita exemplos de tendências existentes na língua, apontadas por essas pesquisas, que atestam processos de mudanças ativos e que não podem ser bloqueados e ignorados em nome de um ideal linguístico.
Segundo a autora um estudo prospectivo dos fatos linguísticos, mostra que se pode recuar para o século XVIII ou avançar para o século XIX, afirmando por meio de exemplos que, alguns usos que se tornaram tão frequentes originaram-se da oralidade e passa a demonstrar por meio de gráficos aspectos da nossa fala que interferem na escrita como o uso do verbo ter por haver, afastando assim o português do Brasil do português de Portugal.
Concluindo seu texto a autora afirma, aos professores de língua materna, aos linguistas, aos estudantes de Letras e aos pedagogos, que é utopia acreditar que o ensino de língua se dará em um contexto de homogeneidade, e aponta que a tarefa da escola e do professor é criar meios para que o aluno possa desenvolver sua competência linguística, uma vez que ele já possui uma gramática internalizada.
Sendo assim a aula de português deve converter-se num momento de reflexão sobre a língua, buscando fazer um exercício continuo de análise e descrição da língua, para que o aluno venha a conhecer as diferentes variedades linguísticas e possa conviver e interagir com cada uma delas.
Cabe, portanto aos professores colocar os alunos em contato com os diferentes tipos de textos sejam eles orais ou escritos para que assim o aluno possa ter o domínio da modalidade de uso e da modalidade culta da sua língua.

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